Olhos nus Olhei para o mundo sem óculos de uma varanda tão alta quanto esta noite Há tempos eu não o fazia Já havia esquecido como é contemplar qualquer coisa com o olhar míope, sem qualquer nitidez Vendo os borrões coloridos das luzes que ainda não apagaram me questiono se a madrugada é dos poetas ou se os poetas é que são da madrugada Não vejo a resposta Com os olhos de quem só vê bem de perto percebo que, com os olhos nus, permaneço em mim mais que quando enxergo longe Não sei se isso é bom ou ruim Com o vento me soprando o rosto sinto que é a noite que me visita, não o contrário Prefiro voltar a me concentrar nesta tela à minha frente que parece ter sido pintada por artista principiante que, por só ter pincéis grossos ou velhos ou por não ter paciência ou destreza enche o quadro de cores borradas, sem qualquer nitidez Penso, então, que assim é que vivo a vida como alguém de muito empenho e nenhuma perfeição mas que, afinal de contas, acaba por fazer com a vid