Olhos nus

Olhei para o mundo sem óculos
de uma varanda tão alta quanto esta noite
Há tempos eu não o fazia
Já havia esquecido como é
contemplar qualquer coisa com o olhar míope, sem qualquer nitidez
Vendo os borrões coloridos das luzes que ainda não apagaram
me questiono se a madrugada é dos poetas ou se os poetas é que são da madrugada
Não vejo a resposta
Com os olhos de quem só vê bem de perto
percebo que, com os olhos nus, permaneço em mim mais que quando enxergo longe
Não sei se isso é bom ou ruim
Com o vento me soprando o rosto
sinto que é a noite que me visita, não o contrário
Prefiro voltar a me concentrar nesta tela à minha frente
que parece ter sido pintada por artista principiante
que, por só ter pincéis grossos ou velhos
ou por não ter paciência ou destreza
enche o quadro de cores borradas, sem qualquer nitidez
Penso, então, que assim é que vivo a vida
como alguém de muito empenho e nenhuma perfeição
mas que, afinal de contas,
acaba por fazer com a vida qualquer coisa de bonito.
(Felipe Rocha, 21 de novembro de 2017)

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