Futuro do pretérito

Sonhei contigo de novo. Nada erótico ou romântico, mas um agradável reencontro.
Houve carinho e toque, mas nada além de um afeto compartilhado por dois amigos.

O cenário – se bem recordo – era uma cidade colonial mineira em que estávamos, cada um, com suas respectivas famílias. 
Vi tua mãe, tua filha, teus tios e primos e também teu marido.
Não houve gatilho e tampouco ciúme, apenas a agradável nostalgia de quem percebe que já viveu bastante. Não em tempo, mas em intensidade.

Enquanto tu ias ter com eles, cuidei da guria como se fosse minha. 
Velei o seu sono e suas brincadeiras, atento aos eventuais perigos do ambiente.
Enquanto o fazia, notei na beleza daquela pequena criatura o valor que à vida o amor dá.

Ao teu retorno, a devolvi ao teu colo. Já era hora de partir. 
Antes da despedida, entretanto, falei que tinha algo importante a dizer.

Sob o teu olhar curioso, te revelei sem delongas: eu teria sido feliz contigo. 
Tu, então, perguntaste: mais do que é?
E eu: Não mais, nem menos. Seria feliz de um modo diferente. 

Tu sorriste um sorriso limpo, sereno e satisfeito. Nos abraçamos e nos despedimos.

Abri os olhos e acordei suavemente, pousando com delicadeza depois de voar alto. 
Acordei sorrindo e sem medo do passado e do fantasma de quem eu poderia ter sido se minhas escolhas tivessem sido outras. 
Senti o coração aquecido, como se o reencontro tivesse sido real.

Realizei que não há problema em manter no coração o amor por quem está distante.
Com o tempo, a sua pureza nos faz alegres com a mera contemplação da felicidade alheia e a dor cede lugar às lembranças que nos fazem sorrir sozinhos. 

(Felipe Rocha, 6 de novembro de 2020)

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